14 setembro 2017

2017 Sul da África - Maun e Moremi

Ainda maior, Maun era mais parecida com Nata que com Kasane. No outro lado da cidade, chegamos ao Motsebe, nos hospedando em tenda permanente. Um pouco down mas aceitável. Deixamos a bagagem e saímos até o aeroporto, próximo, para devolver o carro. Tranquilos, comemos pizzas no Capello, uma espécie de Café Cancun local. Naquela hora, só nós. Voltamos a pé, parando rapidamente no supermercado, beirando a rodovia com ares praianos. Ufa. Cansados, banho em nossos aposentos peculiares e recolhimento, preparando para o safári vindouro.


13/09 quarta-feira


Acordamos tranquilos e esperamos a chegada do guia, Captain, às 9h. Sem surpresas, ele nos embarcou e às malas num 4x4 aberto e confortável, cheio de provisões e recursos. De Maun fomos ao South Gate do parque Moremi, a estrada de terra/areia branca não era tão ruim. Paramos para almoçar os sanduíches e comidas que havia trazido, sem perder de vista os esquilos, treinados no furto tal qual os macacos de Victoria Falls. Seguimos viagem, sacolejando e animados. O safári começa!


Dentro do parque, as trilhas era estreitas, em geral para apenas um carro. As paisagens variam entre savanas douradas, capins variados, altos e baixos, espinhais, bushes cerradozentos, alagados e lagoas, descampadozões - nunca mata fechada ou verdejante nessa época, sempre maravilindo cenário. Aos poucos, fomos avistando nossos queridos animais. Na direção às Black Pools, a primeira manada de elefantes, sobre lama, em refresco sugismundo. Os demais vieram aos borbotões, kudus, antílopes de diversas categorias, galinhas D'Angola (ou da Guiné), impalinhas, javalis e sua persignação devota, todas as girafas, zebras, mangustos em fila, crocodilos, hipopótamos, búfalos (mais raros), hienas repousantes fora de hora, gnus, além de aves. Um desbunde. Era calor mas confortável. Só nós no carro para nove, então nos reassentávamos conforme a conveniência dos raios solares. Bebidas livres. Captain, vulgo Capitão, num primeiro momento por nós diagnosticado TDH, mostrou-se experientíssimo e muito dedicado a nos atender e proporcionar maravilhosa viagem, custe o que custar, como se provou mais adiante.


Ao fim do dia, pousamos junto a grande lagoa repleta de aves de grande porte e variadas espécies, crocos e hipos. Era tempo de bush toilette, fotoa, descida meio vacilante do carro para terra firme, e contemplação apoteótica do pôr do sol savaneiro. Espetáculo.


Seguimos pois, rumo ao camping, no lusco fusco da África austral. Gira daqui, vira de lá, cruza riacho, sombras com perfis leoninos decepcionamente não avistados durante o dia (para profundo pesar do dedicado Capitão). Ao chegarmos, surpresa: nosso staff e respectivo acampamento lá não se encontrava. Capitão, desculpando-se, rumou a outros acampamentos, buscando respostas para a lacuna. Sacolejo ao quadrado em velocidade apurada pelo cair da noite, frio, vento encanado ora tépido ora glacial. Por fim, desce Capitão nas indagações. Restamos nós, beira bush, soa o rugir dos leões - será esse o nosso fim? Não lamentaria, acho justo.


21h30. Circulação noturna, lembramos, proibida com fins turísticos, dado o risco. Novos habitantes, lebre, coruja, hiena. Mas volta o guia, plano B dos safáris, destino camping com camaradagem. Recebidos pois por Moses, famoso da Internet dos blogs safarentos, queridão. Staff na mesma vibe. O hóspede: Steven Lumpkin, cinegrafista e diretor de documentários animalescos da ETOB (Endless Treasures of Botswana). Tão cordial e hospitaleiro que assusta. Originário do Kansas, pela 13a vez no Bots, já no 9o dia de sua viagem e filme. Sua missão: acompanhar os até então não localizados por nós leões de Moremi. Steven nos ofereceu banho, comida e amizade, rapidamente aceitas por mim, Ciça e Clara, respectivamente. Gargalhou Steven na revelação de nosso parentesco (primos). Jantamos, tímidos a princípio, com serviço à francesa. Entrada, prato principal e sobremesa. Seria essa a fome da África? O banho em suíte particular é inacreditável. A água, aquecida, buscada em trajeto de 2h, repousa em chuveiro engenhoso, possibilitando inesperado conforto e quebra-gelo. Ao lado, pasmem, privada, sim, vaso sanitário em material plástico rígido sobre buraco tipo  fossa particular; ambiente a céu aberto, claro. Limpos e impressionados, continuamos o papo até o resgate de Capitão. Despedimos e partimos para nosso camping, mesmo esquema, jantar novamente, pratos, sobremesas, vinhos e gins tonica. Dia longo e surpreendente, tendas-quarto com camas confortáveis, sons da savana.


14/09 quinta-feira


06h00 estávamos sendo chamados por B, sorridente e prestativo. Água quente (!) na pia particular de cada um, espelho, porta-objetos de toucador. Sério, era demais. Reorganizados, fomos ao café, pleno de torradas, geleias, cereais, cafés, frutas - enfim, como num hotel urbano. Bucho cheio, partimos. No rádio de Capitão, dicas de Moses e turma de Steven. Animados, nascer do sol paulatino, friozinho da manhã. Despretensiosos, lânguidos, suavemente rodamos pelas trilhas. Não mais que de repente, uma esquina natural, e dois outros carros contemplando. Leões, ou melhor, leoas. A dois metros de distância, não menos que 20 delas, entre avós, mães e filhas/filhos, variados portes, deitadas, sentadas, erguidas, diversas. Ronronando, rolando, rugindo. Uma experiência felina no estado da arte. O filme-documentário sendo rodado. Ficamos ali de boa e partimos para mais destinos, moremizando, quiçá à caça do leão de juba, macho. Iríamos fazer o passeio pelo Okavango, mais distante, então fomos nos dirigindo para lá. Súbito, Captain, my Captain olhou pegadas (um hábito seu) e uma impala à beira da estrada assustada e atenta; redirecionou o volante para fora da estrada, uma aventura. Sem titubeio, seguiu e avançou ao limite de uma grande árvore. Certeiro. Um big leopardo descansava em berço esplêndido, sua presa por ele assassinado pendurada galho ao lado. Os instintos do nosso ranger africano não falharam! Uma cena extraordinária. Respiração acelerada dele e nossa. Antes de partirmos de vez para as novas zonas, novo encontro com as leoas, outra área, mesma estupefação.


Continuamos por longo trajeto até os canais do delta, passando por regiões do Moremi bem menos populares mas belíssimas. Uma delas apelidamos de Mordor, frente ao ambiente inóspito e hostil. Rabeando a estrada por umas três horas, passadas pontes dignas de Robinsons, chegamos a Mboma. Ali, descemos e fomos guiados até uma canoa, o mokoro, com a qual o guia, falante e jovem, lentamente sepenteava os canais. A ameaça invisível (e inexistente, nesse caso) de crocos e hipos pairava sobre as meninas, não menos que o poder solar das 15h. Verde e lar de aves, o delta é calmo e repousante. Water lilis e paquera guia/
Ciça, uma hora depois, voltamos e embarcamos no sacolejamento para casa. Em dada parte, considerando o último dos grandes animais não avistado, Capitão fez das tripaa coração para encontrarmos um guepardo, ou cheetah. Circundamos todo o seu lar conhecido, mas não houve sucesso. No entanto, avistamos uma bela águia segurando uma cobra em pleno vôo: um símbolo ancestral e multicultural da vitória do bem sobre o mal, por assim dizer, um bom presságio. Cap havia perdido os óculos na ida que foram reencontrados miraculosamente no retorno.


Antes da volta para casa, paramos no pouso do leopardo. Escuro já. Distinguimos suas patas penduradas árvore acima, a comida segura das hienas que esperavam no chão, rodopiando, sem vergonha e em vão. Uma espécie de despedida. Clara, como pela manhã, assustada pela proximidade. Aí seguiu a aventura: o carro atolou/travou. A despeito dos esforços contínuos e profissionais do Cap, nada. Teve que sair do carro. Tomou precauções: passava por dentro e não na frente, abriu as portas de modo a impedir a visão plena do leopardo a sua forma humana distinguível. Usou macaco, pá, iluminamos a noite africana com lanterna de celular. Ciça, melhor dos olhos dentre nós, vigiava o descansado felino. Momentos tensos, mas restou sucesso. Aparentemente, 4x4 quebrado mas motor ok.


Voltamos rápido, já vizinhos do nosso acampamento. Agitados, banho e jantar, completos. Mais drinks e longos causos com nosso já amigo do peito Cap, que noa declarou amor eterno, amor verdadeiro, primeiros brasileiros que fomos em seus 15 anos de profissão. Nem bem nos recolhemos, uma hiena abusada, o que é redundância, vasculhou o camping. Pude vê-la ao nível do chão, cara a cara, pois dormia com a "porta" da cabana aberta, só coberta pelo grosso mosquiteiro. De madrugada, chamados de leões e hienas, motivados por fatos que saberíamos no dia seguinte.


15/09 sexta-feira

Seis da matina mais uma vez, ritual da limpeza e da fome. Tempo do adeus. Ao chef, O. D. e a B. Carro carregado, malas instaladas, devidamente assentados, bye bye ou charp charp. No curto passeio da manhã, elas de novo. Cheiro forte de carniça, carros agrupados, sons leoninos. O grupo havia caçado um jovem elefante, para tristeza feminina, e refastelava-se. Hienas arrodeando, postergando o sono da feiura. Tchau também para elas e Steven e turminha. Trajeto mais direto de volta até o portão sul. Últimos acertos, animais nas margens, incluindo uma matilha de cães selvagens. Partiu Maun. Parada no escritório, onde conhecemos Gally e acertamos as contas. Por fim, aero. Trocas de email, corações apertados, partida final. Últimos momentos no agora respeitado Botsuana, com 85% de suas terras protegidas, considerado um arrojo na sustentabilidade ambiental. Fora as pessoas, doces e amistosas, representadas para nós por emissários exemplares como Rapps e Captain. Última refeição no velho Capello e embarque #umasaudade.

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